Dança dos Figurinos: o olhar do Guto Muniz

O Guto Muniz é um dos maiores parceiros do Grupo Primeiro Ato, como público e fotógrafo. Ele já registrou mais de 10 ensaios e espetáculos do nosso repertório e nos acompanha desde a nossa primeira década de existência. Primeiro como espectador e depois nos registros profissionais de muitas das nossas cenas artísticas.

Realizamos uma entrevista com ele para sabermos um pouco mais da seu olhar para o acervo e história do Primeiro Ato. Ele nos contou um pouco da sua história pessoal e de como nossos caminhos se cruzaram, em uma conversa deliciosa.

Em 1986 ele entrou na faculdade de publicidade, quando ainda tinha pouco contato com o teatro e a dança. Logo depois, em 1987, ele começou a fotografar teatro. Em 1988, durante uma palestra de um fotógrafo profissional que trabalhava com dança, ele se deu conta de que não conseguiria fotografar em uma linha de precisão dos movimentos. Em 1990, foi o seu primeiro encontro conosco, quando assistiu o espetáculo “Carne viva”. Chamou a sua atenção a possibilidade de contar uma história em cena, e a aproximação com o teatro. Próximo de 1993 assistiu o “Isso aqui não é Gotham City” e se apaixonou! Ficou na sua cabeça a profusão de imagens, personagens e figurinos.

Só em 1997 ele fotografou pela primeira vez o Grupo, pelo FIT, no espetáculo “Desiderium”, e depois, em 2002, o “Sem lugar”. Nesse meio caminho, assistiu a outros espetáculos e alguns o marcaram muito, como em 1999 o “Beijo.. nos olhos.. na alma.. na carne”. Segundo ele, esse é o melhor trabalho baseado em Nelson Rodrigues que já viu na vida, incluindo todas as artes. Pois conseguiu tratar do Nelson e de sua obra sem usar palavras, e de forma marcante. A cena das buxinhas é a imagem mais marcante dos nossos trabalhos para ele, a que ficou na sua memória.

Sem Lugar, um espetáculo inspirado na obra e pessoa de Carlos Drummond de Andrade.

BEIJO… NOS OLHOS… NA ALMA… NA CARNE… – Grupo de Dança 1º Ato (Belo Horizonte/MG – Brasil)
BEIJO… NOS OLHOS… NA ALMA… NA CARNE… – Grupo de Dança 1º Ato (Belo Horizonte/MG – Brasil)

Em 2004 foi a primeira vez que ele fotografou o Grupo como fotógrafo convidado, no espetáculo “Mundo Perfumado”. Em seguida, foi a vez do “Geraldas e Avencas”. Para ele, a interferência dos balões como objeto cênico e figurino nessa obra é inacreditável, um achado, com os espelhos e tudo que envolveu a cena artística do trabalho.

GERALDAS E AVENCAS – Grupo de Dança Primeiro Ato / Direção: Suely Machado
GERALDAS E AVENCAS – Grupo de Dança Primeiro Ato / Direção: Suely Machado

Depois, o Guto teve a grata satisfação (e nós, uma felicidade imensa) de fotografar o Beijo e o Gotham nas remontagens. Ele também foi o fotógrafo dos espetáculos “Adorno” onde o figurino o marcou muito, “Pequenos Atos de Rua” onde a delicadeza na rua o encantou, “Pó de Nuvens” quando achou tudo mais leve, e o “Insthabilidade” e “Três luas”, mais recentemente.

ISSO AQUÍ NÃO É GOTHAM CITY – Grupo de Dança Primeiro Ato (Belo Horizonte/MG – Brasil)
ISSO AQUê NÌO ƒ GOTHAM CITY – Grupo de Dan a Primeiro Ato (Belo Horizonte/MG – Brasil)

Três Luas
Três Luas

O último trabalho do Primeiro Ato que ele fotografou foi esse ano, o vídeo-dança Câmera-Homem, pela oitava Mostra Horizontes Urbanos. Essa foi uma experiência diferente, fazer fotografia de vídeo, onde explorou a somatória de frames e as possíveis criações em cima das imagens, preservando as texturas e qualidades do vídeo original.

Entre as curiosidade da nossa conversa, destacamos o fato dele não gostar de ver imagens dos trabalhos que vai fazer para não ser conduzido, já que a imagem marca muito. Além disso, ele adora fotografar ensaios para sentir melhor como são as cenas e a proposta artística do espetáculos, é quando ele também pode explorar mais a linguagem da fotografia, chegando bem próximo dos artistas, usando diferentes lentes como uma grande angular, gerando distorção e outros efeitos mais difíceis de serem trabalhados na cena ao vivo. Para ele, o palco as vezes trava para fotografar a cena, e usar a linguagem fotográfica artisticamente. O seu ritual envolve chegar com meia a uma hora de antecedência, reconhecer os espaços, procurar saber um pouco do espetáculo, da proposta, e antes do público entrar já estar concentrado no local que escolheu para ficar, e ir baixando a adrenalina para conseguir se concentrar na cena.

Nos trabalhos do Primeiro Ato ele destaca o papel dos figurinos na construção dos personagens e dramaturgias e a individualidade de cada bailarino que é possível ser vista, ainda que em um coletivo forte e harmônico.

O olhar do Guto é diferenciado, ele sente pelas lentes, ligado no que está fotografando, procurando entender como enxerga e é tocado pelo que está tentando capturar. Já tem uma intenção fotográfica na escolha das câmeras e lentes e posições no palco, e o que importa mais é a energia da cena, além da estética. Para ele, a fotografia é um respiro, é tudo, e as vezes, quase nada. Daqui a pouco serão 35 anos de fotografia de cena. Sua vida é as artes cênicas, a fotografia e a memória de ambos. A dança é o que mais o ocupa na edição, na pós-produção, onde ele procura que as pessoas pensem além da imagem que estão vendo.

 Essa entrevista com o Guto Muniz fez parte do nosso projeto de pesquisa de acervo, apoiado pela #leialdirblancmg (https://www.secult.mg.gov.br/leialdirblanc).

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